PREFÁCIO

        Já há algum tempo o contexto pedagógico deixou de ser visto como um espaço puramente técnico, caracterizado por uma relação hierárquica entre o professor (o detentor e transmissor de conhecimentos) e o aluno (o receptor desses conhecimentos). Dentro dessa visão tradicional, refletir sobre a sala de aula significava apenas descobrir ou propor procedimentos ou técnicas que pudessem promover mudanças ou melhorias no processo ensino/aprendizagem, sendo que essas deveriam ser, na maior parte das vezes, quantitativamente mensurável. A didática seria, assim, uma disciplina que concretizaria essa abordagem tecnicista do universo educacional.
        Recentemente, o contexto pedagógico passou a ser visto e abordado epistemologicamente como um micro-cosmo das várias relações sociais, histórica e discursivamente determinadas, que caracterizam o contexto maior do qual a sala de aula faz parte e, ao mesmo tempo, ajuda a reproduzir ou até mesmo a construir.
        Nesse sentido, a reflexão sistemática sobre o universo pedagógico passou a requerer um diálogo com perspectivas teóricas bem mais abrangentes, e conseqüentemente, mais complexas, do que as da abordagem de linha didatico-tecnológica. Assim, os conceitos provenientes dessas perspectivas mais amplas, ancoradas numa visão sócio-histórica e discursiva do processo educacional, passaram a nutrir vários estudos que têm como foco questões pedagógicas diversas.
        Os artigos que compõem o presente volume, apesar de terem objetos de investigação e metodologias diferentes, seguem essa tendência.
        Adriana Nóbrega Kuschnir discute, em seu trabalho, como a perspectiva sócio-histórica, preconizada pelos seus principais teóricos (Bakhtin, Vygotsky e Mercer), contribui para uma nova compreensão e abordagem da sala de aula, mais focada no aluno e no processo pedagógico.
        Fabiana da Cunha Ferreira e Maria Cristina Giorgi discorrem sobre a relevância do conceito de intertextualidade, a partir da Análise de Discurso de base enunciativa, para a compreensão leitora no ensino de Espanhol como língua estrangeira.
        Problematizando a transitividade do verbo “educar”, Carmem Diva Rodrigues Jorge Wilson parte de uma discussão de um texto de ficção (Educating Rita) para levantar questões sobre autonomia do aprendiz, relações de poder entre professor e aluno e a reprodução de práticas sociais no processo ensino/aprendizagem. Para isto, a autora lança mão da teoria sócio-construtivista de aprendizagem e a abordagem lingüística de base sistêmico-funcional.
        Tendo como objetivo compreender melhor o comportamento de alunos e monitores de um projeto de ensino de língua estrangeira em uma instituição federal (CLAC/UFRJ), Danielle de Almeida Menezes investiga os hábitos de leitura desses alunos, levando em conta a sua diversidade cultural e sócio-econômica.
        Isabel Cristina Rangel Moraes Bezerra explora a questão da construção de identidades no contexto pedagógico, enfocando o processo de negociação de feminilidades em adolescentes durante uma atividade em grupo.
        A prática exploratória serve de apoio metodológico e filosófico para Beatriz dos Santos Machado estudar, a partir de uma pesquisa etnográfica, o uso do dicionário e as atividades de pré-leitura. O trabalho mostra como a pesquisadora, ao se colocar como co-participante do processo sistemático de reflexão em que estava engajada, pôde, além de compreender melhor a natureza desse processo, rever as suas próprias crenças.
        Finalmente, o contexto maior em que a sala de aula se insere surge como foco principal da pesquisa de Ana Elizabeth Dreon de Albuquerque. Na verdade, esse contexto “extra-escolar”, mais especificamente, os museus, não aparece no artigo apenas como uma referência sócio-histórica. Ele surge tanto como um espaço concreto para um processo dinâmico de ensino/ aprendizagem, como uma fonte produtiva de elaboração de material didático.
        Dessa forma, os sete artigos deste volume enriquecem a reflexão sobre o contexto pedagógico em sua relação com muitos dos aspectos do universo social que não só o influenciam mas que, muitas vezes, o sustentam.




Solange Coelho Vereza
Universidade Federal Fluminense